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Gratidão Dr. Bezerra de Menezes

Marta Antunes Moura 
Vice-presidente da FEB
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GRATIDÃO DR. BEZERRA DE MENEZES, DISCÍPULO DE ISMAEL E UNIFICADOR DO MOVIMENTO ESPÍRITA BRASILEIRO!*

No ano em que se completam 191 anos da última reencarnação do luminoso  benfeitor Espírito Bezerra de Menezes, e 123 anos da sua desencarnação, nada mais justo recordar alguns aspectos da sua trajetória entre nós: “As revelações em torno desse bondoso Espírito o apontam como um dos diretores espirituais da Seara do Mestre em nossa terra, e, nessa condição, ele tem prosseguido a sua obra após a desencarnação, invariavelmente fiel à sua missão que o próprio Jesus lhe confiou uma assembleia realizada no Infinito sob a direção de Ismael, o Anjo do Senhor.” [1]

A vida e obra de Bezerra de Menezes se confunde com a própria história do Espiritismo no Brasil e da missão do país como Pátria do Evangelho, como veremos em seguida.

Em termos de informações históricas, sabemos que o século XIX foi marcado pelo advento da Doutrina Espírita, materializada no Planeta por intermédio de Allan Kardec que publicou várias obras espíritas, a começar com O Livro dos Espíritos, em 18 de abril de 1857. As ideias espíritas alcançaram, de imediato, o Brasil. A partir de então, segundo os planos de Jesus, executados por Ismael, foi definida a missão espiritual do país, como esclarece o Espírito Humberto de Campos:  “Ia resplandecer a suave luz do Espiritismo, depois de certificado o Senhor da defecção espiritual das igrejas mercenárias, que falavam no globo e seu nome.  Todas as falanges do Infinito se preparam para a jornada gloriosa. As abnegadas coortes de Ismael trazem as suas inspirações para as grandes cidades do país do Cruzeiro, conseguindo interessar grande número de estudiosos. […].” [2]

Antes das primeiras experiências espíritas no Brasil, no findar do Primeiro Reinado, Ismael realiza uma assembleia no plano espiritual com os seus dedicados cooperadores ─  entre eles encontra-se o venerável Bezerra de Menezes ─  para esclarecer a respeito dos acontecimentos previstos para os séculos seguintes:  “— Irmãos, expôs ele, o século atual, como sabeis, vai ser assinalado pelo advento do Consolador à face da Terra. Nestes cem anos se efetuarão os grandes movimentos preparatórios dos outros cem anos que hão de vir. […]. Uma verdadeira renascença das filosofias e das ciências se verificará no transcurso destes anos, a fim de que o século XX seja devidamente esclarecido, como elemento de ligação entre a civilização em vias de desaparecer e a civilização do futuro, que assentará na fraternidade e na justiça. […].” [3]

Em seguida, Ismael declara a missão do Brasil, no concerto das nações: 

[…] Concentraremos, agora, os nossos esforços na terra do Evangelho, para que possamos plantar no coração de seus filhos as sementes benditas que, mais tarde, frutificarão no solo abençoado do Cruzeiro. […]. Se as verdades novas devem surgir primeiramente, segundo os imperativos da lei natural, nos centros culturais do Velho Mundo, é na Pátria do Evangelho que lhes vamos dar vida, aplicando-as na edificação dos monumentos triunfais do Salvador. Alguns dos nossos auxiliares já se encontram na Terra, esperando o toque de reunir de nossas falanges de trabalhadores devotados.  ” [4]

Após breve pausa, Ismael “[…] encaminhando-se para um dos dedicados e fiéis discípulos, falou-lhe assim:” [5]

 — Descerás às lutas terrestres com o objetivo de concentrar as nossas energias no país do Cruzeiro, dirigindo-as para o alvo sagrado dos nossos esforços. Arregimentarás todos os elementos dispersos, com as dedicações do teu espírito, a fim de que possamos criar o nosso núcleo de atividades espirituais, dentro dos elevados propósitos de reforma e regeneração. Não precisamos encarecer aos teus olhos a delicadeza dessa missão; mas, com a plena observância do código de Jesus e com a nossa assistência espiritual, pulverizarás todos os obstáculos, à força de perseverança e de humildade, consolidando os primórdios de nossa obra, que é a de Jesus, no seio da pátria do seu Evangelho. Se a luta vai ser grande, considera que não será menor a compensação do Senhor, que é o Caminho, a Verdade e a Vida.” [5]

Identificamos, de pronto, a quem Ismael faz referência como dedicado e fiel discípulo: “Daí a algum tempo, no dia 29 de agosto de 1831, em Riacho do Sangue, no Estado do Ceará, nascia Adolfo Bezerra de Menezes, o grande discípulo de Ismael, que vinha cumprir no Brasil uma elevada missão.” [6]

Como o espaço reservado para este artigo é restrito para escrever a respeito da vida e obra de Dr. Bezerra, inserimos, em seguida, algumas informações gerais, apenas com o intuito de fornecer ao leitor visão panorâmica dos feitos consideradas mais relevantes do venerável benfeitor que, do plano espiritual, prossegue em sua missão de cristianização. 

  1. BEZERRA DE MENEZES, O CIDADÃO, MÉDICO, O ESCRITOR  E POLÍTICO BRASILEIRO [7]

Adolfo Bezerra de Menezes Cavalcanti nasceu no Ceará, na cidade de Riacho de sangue, em 29 de agosto de 1831. Desencarnou no Rio de Janeiro, em 11 de abril de 1900 cujo evento foi assim, registrado por Léon Denis, o grande filósofo espírita e outro fiel discípulo de Allan Kardec: “Quando tais homens deixam de existir, enluta-se não somente o Brasil, mas os espíritas de todo o mundo”. [8]

Em 1858, casa-se com   Maria Cândida de Lacerda, que viria a falecer de mal súbito em 24 de março de 1863, deixando-lhe dois filhos pequenos, um de três e outro de um ano de idade. Em 1865 desposou, em segundas núpcias, a cunhada Cândida Augusta de Lacerda Machado (irmã por parte de mãe da sua primeira esposa), que cuidava de seus filhos. Com Cândida Augusta teve mais sete filhos. [7]

Bezerra de Menezes foi escritor e portador de grande cultura, um intelectual de peso, que não se limitava ao conhecimento teórico, vivenciando suas ideias com firmeza e decisão. Ele era também fluente em pelo menos três línguas, além do português: latim, espanhol e francês. Foi um ser humano notável, em elevação moral e conhecimento: médico, militar, escritor, jornalista, político, filantropo e reconhecido expoente da Doutrina Espírita. Devido à sua inclinação para o bem, é também conhecido como O Médico dos Pobres, título que lhe cai muito merecidamente, pela sua atuação de médico caridoso junto à população mais pobre. [7]

É relatado em uma das suas biografias, o episódio que Bezerra doou o seu anel de grau em medicina a uma mãe para que comprasse os remédios de que seu filho precisava. Afirmava, convictamente:

O médico verdadeiro é isto: não tem o direito de acabar a refeição, de escolher a hora, de inquirir se é longe ou perto… O que não acode por estar com visitas, por ter trabalhado e achar-se fatigado ou por ser alta à noite, mau o caminho e o tempo, ficar perto ou longe do morro; o que sobretudo pede um carro a quem não tem com que pagar a receita, ou diz a quem lhe chora à porta que procure outro – esse não é médico, é negociante da medicina, que trabalha para recolher capital e juros dos gastos da formatura. [9]

Antiescravagista convicto, muito trabalhou para libertar o Brasil da escravidão negra, chegando a escrever um pequeno livro a respeito, em 1869. Esta obra, publicada com os próprios recursos, foi distribuída gratuitamente. [7]

Publicou também outro livro a respeito do assunto, durante a Campanha Abolicionista (1869): A escravidão no Brasil e as medidas que convém tomar para extingui-la sem dano para a Nação“, onde não só defende a liberdade aos escravos, mas também a inserção e adaptação dos mesmos na sociedade por meio da educação. Expôs os problemas de sua região natal em outro ensaio publicado, “Breves considerações sobre as secas do Norte (1877) “Escreveu também outras obras: biografias, e ensaios.  Além de obras e artigos espíritas. [7]

Em razão do destaque de Bezerra de Menezes como médico, professor, escritor, militar e, sobretudo, pelo trabalho voltado à população carente, em 1860, amigos próximos o convenceu a candidatar-se à vereador da Câmara, pelo partido Liberal, representando a paróquia de São Cristóvão, onde ele residia. Bezerra foi eleito, mas alguns adversários impugnaram a posse sob o argumento de que militares de Segunda Classe não podiam exercer o cargo de vereador. Para poiar o Partido, que necessitava dele para obter a maioria na Câmara, decidiu requerer exoneração do Corpo de Saúde do Exército, em 26/03/1861. Desta forma, desfeito o impedimento, foi empossado no mesmo ano. Foi reeleito vereador da Câmara Municipal do período de 1864 a 1868.  Em razão da bela atuação com representante do povo, 1866 foi eleito Deputado Provincial pelo Rio de Janeiro, empossado em 1867.[7] Mais tarde, é eleito deputado geral pela Província do Rio de Janeiro, no período de 1877 a 1885, ano em que encerrou a sua carreira política. 

Durante o período que atuou como político, acumulou a presidência da Câmara e do Poder Executivo Municipal. Como deputado, destacam-se algumas iniciativas pioneiras: buscou, através de projeto de lei, regulamentar o trabalho doméstico, visando conceder a essa categoria, inclusive, o aviso prévio de 30 dias; denunciou os perigos da poluição que já naquela época afetava a população do Rio de Janeiro, promovendo providências para combatê-la. Foi membro, a partir de 1882, das Comissões de Obras Públicas, Redação e Orçamento, onde atuava com decisão. [7]

  1. BEZERRA DE MENEZES, O ESPÍRITA 

No meio espírita, Bezerra de Menezes é conhecido como O Kardec Brasileiro e O Médico dos Pobres, em razão do seu compromisso com a Codificação Espírita, assim como pela atenção e defesa das pessoas destituídas de bens materiais, em geral, mantidas à margem da sociedade.  Percebe-se, entretanto, que a partir da mensagem Unificação10, psicografia de Francisco Cândido Xavier, transmitida em 20-4-1965, na Comunhão Espírita Cristã, em Uberaba-MG, Dr. Bezerra dá prosseguimento à decisão de trabalhar pela união dos espíritas e unificação do Movimento Espírita brasileiro. Missão essa que está explicita nas palavras que Ismael lhe dirigiu, antes da sua última reencarnação, e que merecem ser repetidas: “[…] Arregimentarás todos os elementos dispersos, com as dedicações do teu espírito, a fim de que possamos criar o nosso núcleo de atividades espirituais, dentro dos elevados propósitos de reforma e regeneração. […].” [11]

 As suas ideias união e unificação foram manifestadas com mais ênfase durante as duas gestões como presidente da Federação Espirita Brasileira/FEB, ocorridas em 1889 e 1895–1900, quando teve a iniciativa de sugerir aos espíritas o estudo regular das obras espíritas, priorizando o aspecto moral da Doutrina Espírita, consoante mensagens transmitidas por Espíritos superiores. Entre elas destacamos duas, uma de Ismael que assim dizia:  “A missão dos espíritas, no Brasil, é divulgar o Evangelho em espírito e verdade”;  e a do Espírito Urias: “A cada povo a sua tarefa. A vossa, é o Evangelho: tendes de educar os corações.” Tal orientação se refletiu no Reformador, do qual era redator-chefe, e a ela a Casa de Ismael tem conservado fiel até agora.” 12 Importa destacar que foi Dr, Bezerraq, ue iniciou o estudo sistematizado de O Livro dos Espíritos nas reuniões públicas da FEB, e que continua a ser realizado até o presente momento. [13]

À época de suas atividades na FEB, Dr.  Bezerra já possuía pleno conhecimento da Doutrina Espírita, cuja primeira obra (O Livro dos Espíritos) lhe fora presenteada pelo amigo e médico, Joaquim Carlos Travassos (1839-1915), tradutor do livro para a língua portuguesa, em 1875, a partir da 20ª edição francesa.   Ele relata as impressões que tivera após a leitura da primeira obra da Codificação: “Lia, mas não encontrava nada que fosse novo para meu espírito, entretanto tudo aquilo era novo para mim […]. Eu já tinha lido ou ouvido tudo o que se achava no Livro dos Espíritos […]. Preocupei-me seriamente com este fato maravilhoso e a mim mesmo dizia: parece que eu era espírita inconsciente, ou mesmo, como se diz vulgarmente, de nascença”. [14]

Como espírita, desenvolveu intensa atividade intelectual, publicando vários livros: A Casa Assombrada, A Loucura sob Novo Prisma, A Doutrina Espírita como Filosofia Teogônica, Casamento e Mortalha, Pérola Negra, Lázaro, o Leproso, Os Carneiros de Panúrgio, História de um Sonho e Evangelho do Futuro. 14 Traduziu o livro Obras Póstumas, de Allan Kardec, em 1892, quando ocupava o cargo de vice-presidente da Federação Espírita Brasileira. 15 Dr. Bezerra de Menezes publicou, também, vários artigos espíritas no periódico O Paiz, assim como no Jornal do Brasil e na Gazeta de Notícias, utilizando o pseudônimo de Max. “Em 1907, a FEB reuniria em livro (3 volumes), sob o título EspiritismoEstudos Filosóficos, os artigos de Bezerra, de 1887 a 1893.” [16]

No plano extrafísico, o benfeitor amigo prossegue em seu trabalho incessante do bem, atuando com segurança e amor na seara do Cristo. Fazemos nossas estas palavras do amigo Juvanir Borges de Souza, também um dos ex-presidentes da FEB:  “Assim é que, como Espírito, Bezerra de Menezes se tem desvelado no exercício da caridade e da humildade, aqui conclamando os adeptos à união fraterna, ali levantando os que tombam, curvados sob o peso das ásperas provações terrenas, acolá encaminhando Espíritos endurecidos no erro para a regeneração, a todos dando o exemplo da abnegação, do devotamento, da mansidão, da benevolência, da indulgência, do perdão, como únicas vias da felicidade.” [17]

Do fundo do coração, só  temos algo mais a acrescentar:

“Gratidão, Dr. Bezerra!”

 

REFERÊNCIAS

  1. SOUZA, Juvanir Borges. (Organizador). Bezerra de Menezes: ontem e hoje. 4 ed. Rio de Janeiro: FEB, 2008. Ã guisa de apresentação, p.11.
  2. XAVIER, Francisco Cândido. Brasil, coração do mundo, pátria do evangelho. 33 ed. 4 im. Brasília: FEB, 2013. Cap. 22, p. 136. 
  3. _______. p, 137.
  4. _______. p. 137-138.
  5. _______. p. 138.
  6. _______. p. 138.
  7. Nota: As informações biográficas foram pesquisadas nas seguintes referências, inseridas no artigo na forma de paráfrases:
    – BLAKE, Augusto Victorino Alves Sacramento (1883). Diccionario Bibliographico Brazileiro. 1. Rio de Janeiro: Typographia Nacional. pp. 8–9. Câmara dos Deputados. Bezerra de Menezes. Col. Perfis Parlamentares, n° 83. Brasília: 1986.
    – Câmara Municipal do Rio de Janeiro Vereadores Históricos – Bezerra de Menezes»
    – Célia da Graça Arribas. Afinal, espiritismo é religião? A doutrina espírita na formação da diversidade religiosa brasileira, p. 135.
    – Universidade de São Paulo, 2008. Cury, Aziz (2008). Legado de Bezerra de Menezes. São Paulo: Elevação. ISBN 978-85-7513-091-9.
    – FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA. http://www.febnet.org.br/wp-content/uploads/2012/06/Adolfo-Bezerra-de-Menezes.pdf
    – GIUMBELLI, Emerson. “Kardec nos Trópicos”. in Revista de História da Biblioteca Nacional, ano 3, nº 33, junho de 2008, p. 14-19.
    – SANTOS, Dalmo Duque dos (2007). Nova História do Espiritismo. Dos precursores de Allan Kardec a Chico Xavier 1ª ed. Rio de Janeiro: Corifeu. 402 páginas. 
    – REFORMADOR. Segundo entrevista realizada em 1892 pela Federação Espírita Brasileira e publicada no periódico O Reformador. Disponível em: «Bezerra de Menezes é entrevistado».
    – WANTUIL, Zeus. Grandes Espíritas do Brasil. FEB

  8. https://www.febnet.org.br/wp-content/uploads/2012/06/Adolfo-Bezerra-de-Menezes.pdf Acesso em 26/01/2020
  9. Abib, Dorothy J. (2011). “Nas biografias destes personagens, encontra-se um Bezerra de Menezes que dá o seu anel de grau de médico a uma mãe para que compre os remédios de que seu filho precisava, porque ele não tinha, no bolso, nenhum dinheiro.”. «Spiritist Culture in Brasil» (PDF). IBICT. Brazilian Cultural Studies2 (2): p.118
  10. SOUZA, Juvanir Borges. (Organizador). Bezerra de Menezes: Ontem e hoje. 4 ed. Rio de Janeiro: FEB, 2008. 3a Parte, it. 1, p.97-100.
  11. XAVIER, Francisco Cândido. Brasil, coração do mundo, pátria do evangelho. 33 ed. 4 imp. Brasília: FEB, 2013. Cap. 22, p. 138.
  12. WANTUIL, Zeus. Grandes espíritas do Brasil. 4 ed. Rio de Janeiro: FEB, 2002. Cap. Adolfo Bezerra de Menezes. p. 234-235. 
  13. _______. p. 235.
  14. _______. p. 232.
  15. _______. p. 233-234.
  16. _______. p. 237.
  17. SOUZA, Juvanir Borges. (Organizador). Bezerra de Menezes: Ontem e hoje. 4 ed. Rio de Janeiro: FEB, 2008. It. À guisa de apresentação, p. 11-12.

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